
"Evocação - minha vida com Che" é o relato de sua viúva e mãe de quatro de seus filhos, Aleida March, sobre os oito anos que viveram juntos
Nos 50 anos da revolução cubana, em meio a uma esperada reaproximação com os EUA, o comandante Che Guevara está mais presente que nunca, e não apenas em camisetas e bottons. Além do ótimo filme ("Che"), com impressionante interpretação de Benício Del Toro, novos livros foram lançados sobre o eterno e ultracarismático guerrilheiro.
"Evocação - minha vida com Che" é o relato de sua viúva e mãe de quatro de seus filhos, Aleida March, sobre os oito anos que viveram juntos. Escrito quarenta anos depois da execução de Che na Bolívia, o livro traz fatos, fotos, documentos, poemas e especialmente cartas inéditas, em que se revela seu lado mais afetuoso e menos conhecido.
O duro e irredutível braço direito de Fidel Castro nunca havia, afinal, perdido a ternura. O que não significa que sua vida de casado tenha sido um mar de rosas. No governo cubano, na Rússia, Congo, Argélia ou finalmente na Bolívia, Che Guevara vivia acima de tudo para a revolução, com pouco tempo para idílios domésticos.
Mesmo assim, o depoimento de Aleida é muito precioso - ela mesma era uma revolucionária bastante corajosa, tendo conhecido o futuro e lendário marido em meio a tiros e explosões. Seu tom não cede a sentimentalismos, muito ao contrário. Orgulhosa de sua história, Aleida escreve como quem olha nos olhos do leitor.
"De Ernesto a Che", de Carlos "Calica" Ferrer, é também um depoimento pessoal. "Calica", amigo de infância do jovem asmático Ernesto Guevara de La Serna, conta como foi a viagem que fizeram pela América Latina, um ano depois daquela que ficou famosa no filme "Diários de Motocicleta" e no livro "De Motocicleta pela América do Sul" (Sá Editora).
Com pouquíssimo dinheiro mas muita disposição, partem num trem em Buenos Aires e vão para a Bolívia, atraídos pela revolução social por que passava o país. Depois vão ao Peru e Equador. O destino final seria a Venezuela, onde Che assumiria um posto num hospital de leprosos.
O livro, mais indulgente e descompromissado, é pródigo em anedotas, mas também mostra como Che, já um estudioso de Marx, Freud e Lênin, consolidava sua consciência social diante da miséria de índios e negros que testemunhava no caminho, e se preparava para lutar contra toda e qualquer injustiça a que estavam expostos os povos latino-americanos.

"De Ernesto a Che", de Carlos "Calica" Ferrer, é relato pessoal em que o autor conta como foi a viagem que fizeram pela América Latina
Biografias
Quem quiser se informar mais detalhadamente sobre a vida de Che Guevara tem duas excelentes opções: "Che - a Biografia" (Objetiva), do jornalista e correspondente de guerra John Lee Anderson, e "Che Guevara: a vida em vermelho" (Companhia das Letras), do estudioso mexicano Jorge G.Castañeda.
Curiosamente, os dois livros foram lançados quase simultaneamente, em 1997, frutos de pesquisas exaustivas, que correram paralelamente. Fica inevitável compará-los.
O primeiro é tido como mais completo. Anderson, conhecido por sua cobertura dos conflitos no Oriente Médio, ficou cinco anos morando em Cuba e entrevistou, entre tantos outros, Aleida March, que até então se mantivera em silêncio.
O nível de detalhamento de seu livro caudaloso (920 páginas, incluindo notas e bibliografia) impressiona. No longo trecho sobre a campanha na Sierra Maestra, é como se estivéssemos lá, vivendo nas difíceis condições dos guerrilheiros, lado a lado com Che, Camilo Cienfuegos e outros heróis menos famosos.
Acompanhamos os próprios pensamentos de Che, através de trechos escolhidos de seus diários - alguns inéditos, em que fica ainda mais clara sua ética de coragem e determinação e também seu lado absolutamente objetivo, por vezes implacável.
Não à toa, Anderson foi o principal consultor do filme de Steven Soderbergh.
O livro de Castañeda, por sua vez, é também bastante detalhado, mas adota um tom mais fluido, agradável, e se lê quase como romance. É mais curto também ("só"630 páginas), e portanto mais indicado para quem desanima diante de calhamaços.
Quadrinhos
O idealista do "Homem Novo", cantado em verso, cinema e prosa, foi parar também nos quadrinhos. A Conrad lançou recentemente o excelente "Os últimos dias de um herói", do argentino Hector Oesterheld e os uruguaios Alberto e Enrique Breccia, em que um desenho expressivo, feito de contrastes, retrata a malfadada campanha boliviana do filho de Célia Guevara.
O livro foi originalmente lançado com estrondoso sucesso em 1968, três meses depois da morte de Che, mas proibido em 1973. Por conta dele, em 1977 Oesterheld e suas quatro filhas foram barbaramente torturados e mortos pela ditadura argentina. A presente edição traz prefácio comovente de Ernesto Sábato.
"Che - uma biografia", por sua vez, é uma curiosa transposição para o universo dos mangás da incrível história do "mais completo ser humano de nossa época", nas palavras do filósofo Jean-Paul Sartre. O autor é o coreano Kim Yong-Hwe.
E mais
Há ainda outros livros importantes para se conhecer a vida e obra do mito nascido em Rosário. O principal deles talvez seja, por motivos óbvios, "O Diário de Che na Bolívia", da Record. Também sobre a guerrilha que resultou em sua morte, aos 39 anos, há "Che Guevara e a luta revolucionária na Bolívia" (Xamã Editora), do historiador carioca Luiz Bernardo Pericás, que ainda escreveu "Che Guevara e o debate econômico em Cuba" (Xamã) e "Um andarilho das Américas" (Editora Elevação). Sobre o Che estrategista, fundamental para a derrubada do regime de Fulgêncio Batista, especialmente depois da tomada de Santa Clara, há "Comandante Che" (Globo), de Paul Jaime Dosal.
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